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Entrevista: Meninas Olímpicas e o protagonismo científico das mulheres em olimpíadas científicas

Se observarmos como são constituídas as relações de gênero, ainda hoje, percebemos a grande diferença na ocupação de espaços de poder, participação em espaços públicos e diferenças salariais entre homens e mulheres. O mesmo ocorre no cenário científico e de Olimpíadas de conhecimento, tanto no Brasil quanto no exterior, com a baixa participação de meninas nessas competições. 

Natália e Mariana Bigolin Groff (arquivo pessoal)

Foi visando incentivar o protagonismo feminino nesses espaços que, em 2016, foi criado o Movimento Meninas Olímpicas. Coordenado pela professora Nara Martini Bigolin, docente do curso de Sistemas de Informação, da UFSM campus Frederico Westphalen, e idealizado também por suas duas filhas, Natália e Mariana Bigolin Groff, que são medalhistas olímpicas nas áreas da ciência e da linguística. 

O movimento trouxe impacto positivo na representação feminina em olimpíadas. Em 2020, por exemplo, ocorreu o 1º Torneio Brasileiro de Computação, que teve a coordenação da Professora Nara, e encorajou a participação das meninas na Olimpíada Brasileira de Informática. A mesma, que até o ano de 2020 tinha em torno de 10% de meninas medalhistas na modalidade programação, passou a ter 25%.  Conversamos com a professora sobre a importância e o impacto do projeto nestes cinco anos.

Como é desenvolvido o projeto Meninas Olímpicas? 

Através de ações de conscientização em relação a desigualdade de gênero nas olimpíadas de conhecimento junto às coordenações de olimpíadas do Brasil, além de participar ou coordenar olimpíadas apenas para meninas, como o Torneio Feminino de Computação (na segunda edição) e Olimpíada Feminina de Matemática do Estado da Bahia (em sua primeira edição). Outra ação muito importante é junto às Assembleias Legislativas do Brasil com a criação de um prêmio anual permanente chamado Prêmio Meninas Olímpicas.

O projeto meninas olímpicas começou em 2016 com o objetivo de espaços para mulheres na matemática, mas já em 2019 havia uma atuação de destaque também em outras áreas do conhecimento. Como a senhora compreende esse movimento e sua importância? 

O movimento começou atuando nas áreas de Matemática, Química, Informática, Física desde 2016, pois essas áreas são as mais críticas. Hoje atuamos em todas as áreas como Economia, Biologia, Astronomia e outras olimpíadas menores.

Ao longo desses 5 anos do movimento incentivando e acompanhando meninas em olimpíadas de conhecimento, qual o impacto percebido nas meninas em receber esse auxílio ao acesso aos estudos e as olímpiadas? 

O impacto foi enorme, pois as meninas começaram a tentar e ter resultados espetaculares. Os resultados apareceram nas premiações em várias olimpíadas nacionais e internacionais. 

Como um movimento de incentivo a alunas, que já possui notoriedade nacional e internacional, como você percebe a importância social do Movimento Meninas Olímpicas? 

Esse movimento é um divisor de águas no mundo olímpico. A minoria feminina em olimpíadas era um tema inexistente. Hoje todas as olimpíadas do Brasil e algumas internacionais debatem o assunto e desenvolvem ações afirmativas.

Em uma fala anterior, você ressalta a disparidade de premiação entre mulheres e homens, principalmente, na área das ciências exatas. A senhora acredita que o projeto é um movimento impulsionador para transformar essa realidade?

Esse movimento já transformou muitas realidades e continua transformando todos os dias. No RS, por exemplo, em 2014 as meninas eram apenas 4 medalhistas de ouro, em 2016 passou a 9 e 2018 foram 15 meninas. Depois que organizamos o Torneio Feminino de Computação, as meninas premiadas na modalidade programação Nível 1 da Olimpíada Brasileira de Informática passou de 10% para 25%. As meninas eram inexistentes nas equipes internacionais, este ano tivemos 15 meninas nas equipes internacionais, sendo que, na Informática, uma brasileira teve o melhor desempenho feminino do mundo. Nas olimpíadas internacionais de química, raramente a equipe de 4 pessoas tinha meninas Em 2018, uma menina conquistou o 1º ouro para o Brasil e neste ano a equipe era composta por 75% de meninas. Todos os anos, temos resultados inéditos quanto a participação feminina nas olimpíadas internacionais. Os 5 anos de existência do Movimento Meninas Olímpicas transformou o mundo olímpico. Hoje ser menina olímpica é um orgulho nacional.

Em pé, três mulheres no palco do plenário da Assembleia legislativa do rio grande do sul. Ao centro, a professora Nara segura um buquê de flores. Ao seu lado, suas duas filhas.
Professora Nara Bigolin (centro) já recebeu o prêmio Mulher Cidadã do RS pela Assembleia Legislativa do estado

Na matemática existem estudos mostrando que meninas e meninos têm igual aptidão para a matéria, porém, ao chegar na adolescência, parece que o interesse pela matemática e a participação em competições na área diminui entre elas. Como você compreende essa desmotivação por parte das meninas?

O sistema machista e patriarcal tira todas as oportunidades das meninas. Segundo a ONU, 87% das meninas a partir de 12 anos fazem atividades domésticas, contra 11% dos meninos, ou seja, enquanto as meninas lavam a louça e cuidam dos irmãos, os meninos estudam matemática. Não se trata de perder interesse, mas não ter oportunidades iguais. 

As mulheres ainda ocupam menos espaços de poder e prestígio na sociedade. A senhora acredita que o projeto é um incentivador para que meninas e mulheres atinjam cada vez mais espaços de poder? 

Eu realmente acho que esse projeto pode tirar o Brasil da posição de um dos países mais machistas do mundo e permitir que nossas meninas olímpicas de hoje sejam as mulheres nos espaços de poder amanhã. Sem conhecimento e treinamento adequado é muito difícil as mulheres acederem ao poder. O sucesso desse projeto é sem dúvida devido ao desempenho das fundadoras do movimento, as irmãs Natalia e Mariana Groff que além de obterem mais de 80 medalhas em olimpíadas de conhecimento, são o exemplo vivo de que é possível ser protagonista através do conhecimento. Hoje Mariana estuda em Stanford nos EUA e a Natalia na escola internacional United World College Maastricht na Holanda.

Reportagem: Katiana Campeol
Edição: Davi Pereira
Fotos: Arquivo pessoal

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