O Escritório Modelo de Engenharia da UFSM vai elaborar o projeto de construção de uma nova ponte na cidade de Alegrete, sobre o Rio Ibirapuitã. Ela será construída ao lado da ponte Borges de Medeiros (que liga as avenidas Alexandre Lisboa e Ibicuí), principal ponto de ligação entre o centro e a região leste da cidade. Essa região conta com locais importantes para o município, como o campus local da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), o Parque de Exposições Dr. Lauro Dornelles e supermercados. Estima-se que a nova ponte tenha entre 100 e 110 metros de comprimento, e altura de 1,5 a 2 metros acima da ponte atual. A obra vai permitir a duplicação do tráfego no local, auxiliando na redução do intenso trânsito de veículos em um dos trechos mais importantes da cidade.
Atualmente o projeto está na fase de levantamentos. Os estudos hidrológicos, que levam em consideração aspectos como profundidade do rio, velocidade da água, níveis de chuva e altura atingida durante as cheias, já foram concluídos. Após a coleta dos registros de chuvas e imagens de satélite para conhecer as áreas de inundação do Rio Ibirapuitã, realiza-se uma extrapolação estatística para garantir que a ponte se mantenha funcional mesmo em níveis de chuvas tão elevados que ocorrem uma vez a cada cem anos. A ponte Borges de Medeiros já teve de ser interditada várias vezes, durante períodos de fortes chuvas, devido à cheia do rio.
Após o levantamento hidrológico, ocorre o levantamento topográfico. Para projetar as fundações da ponte, a equipe da UFSM aguarda o trabalho de estudo do solo, que vai ser realizado por uma empresa contratada pela Prefeitura de Alegrete. Os levantamentos realizados pelo escritório de engenharia da UFSM também vão trazer dados mais precisos sobre o rio, por conta dos equipamentos avançados que a universidade possui, como o ADCP, que utiliza ondas sonoras para medir a velocidade da água.
Em sequência, o Escritório Modelo atua na etapa de orçamentação do projeto, na qual o escritório elabora em conjunto com a prefeitura os documentos que serão utilizados no processo de licitação da obra. A duração estimada da elaboração desta parte documental é de aproximadamente 90 dias. As licitações para a seleção da empresa que vai construir a ponte devem ser realizadas em 2027.
“A obra não vai ser muito complexa. Sem interferência externa, como fenômenos climáticos ou falta de recursos, ela deve ficar pronta em menos de um ano, mas isso depende também de como a empresa vencedora da licitação vai gerir os recursos, explica o professor André Lübeck, integrante do Escritório Modelo de Engenharia. Ainda de acordo com o professor, a elaboração do projeto da ponte, que abrange técnicas de construção e materiais utilizados, é pensada de acordo com as características do município, uma cidade de interior distante dos grandes centros. Sem este cuidado, a obra pode se tornar cara e complexa.
A nova ponte será construída entre a ponte Borges de Medeiros e a ponte férrea ao lado, atualmente desativada. A via ferroviária foi palco de uma das batalhas mais marcantes da Revolução de 1923, travada na travessia do Ibirapuitã, onde ocorreu o choque entre chimangos e maragatos. As tropas na ocasião foram comandadas por dois dos maiores líderes militares da história gaúcha: Honório Lemes (maragato) e José Antônio Flores da Cunha (chimango).
Lições trazidas pela emergência climática
O professor explica que as ocorrências climáticas extremas já não são mais tratadas como crises na área de construção civil, mas sim como eventos recorrentes. “As enchentes de 2023 foram marcantes, mas já no ano seguinte algumas regiões tiveram chuvas em um nível muito próximo ao ano anterior. Então é muito provável que estes eventos extremos aconteçam de forma frequente”.
Para projetar estruturas que resistam a estes eventos, os levantamentos hidrológicos são imprescindíveis por trazerem dados precisos baseados em estatística sobre a velocidade e a altura que a água pode atingir em volumes excepcionais de chuva. No entanto, Lübeck cita que estes levantamentos eram muitas vezes negligenciados pelo poder público. Por ser um estudo custoso, demorado e que demanda um conhecimento muito específico que poucas empresas fazem, ele geralmente está vinculado a universidades.
Um exemplo de aplicação desse estudo está no projeto que o Escritório Modelo de Engenharia fez para uma ponte sobre o Rio Toropi, que liga os municípios de São Pedro do Sul e Quevedos. Neste trecho já ruíram quatro pontes construídas anteriormente. O levantamento hidrológico mostrou que, em situações de cheia, o nível do Rio Toropi ficava de sete a oito metros acima da ponte, enquanto que a velocidade da água variava de seis a sete metros por segundo.
Esta velocidade, correspondente a mais que o dobro do estimado nas principais bibliografias sobre construção de pontes, ocorre por conta das condições únicas de relevo do local. “A velocidade causa uma pressão com intensidade elevada ao quadrado do valor da água. São pressões muito maiores do que as que temos registradas na bibliografia”, detalha o professor André Lübeck.
Os acontecimentos recentes também impactam nas projeções estatísticas das grandes chuvas, com períodos de recorrência maiores para projetos cada vez mais resistentes. “Temos discutido projeções de tempo cada vez maiores porque algumas das pontes que foram danificadas nas enchentes de 2023 receberam volumes de água correspondentes a chuvas que ocorrem uma vez a cada 350, 400 anos”, aponta o professor.
Projeto de extensão da UFSM, o Escritório Modelo de Engenharia auxilia órgãos públicos e entidades sem fins lucrativos na elaboração de projetos de engenharia, acompanhamento de obras, realização de cursos de capacitação, consultorias e assessoramentos técnicos, quando essas instituições têm dificuldades para realizar e contratar esses serviços. As atividades são realizadas por acadêmicos dos cursos de graduação e pós-graduação em Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo e áreas afins da UFSM, sob a supervisão de professores orientadores.
A equipe que participou dos levantamentos foi a seguinte: professores André Lübeck, Rogerio Antocheves de Lima e Almir Barros do Santos Neto (docentes do Departamento de Estruturas e Construção Civil), do Escritório Modelo de Engenharia; Allan Klein, engenheiro técnico do Centro de Tecnologia (CT); e professores Rutineia Tassi, Daniel Allasia Piccilli e João Francisco Horn, do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental. O projeto também conta com o apoio da Secretaria de Obras de Alegrete.
Texto: Bernardo Silva, estudante de Jornalismo e bolsista da Agência de Notícias
Arte Gráfica: Lisa de Mello, estudante de Desenho Industrial e estagiária da Agência de Notícias
Edição: Lucas Casali
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